ABORTO FLORAL DA MACIEIRA
O abortamento floral em macieiras é um fenômeno recorrente no Sul do Brasil, impactando negativamente a frutificação efetiva e, consequentemente, a produtividade dos pomares. Esse processo está relacionado à indução floral, que ocorre entre 30 e 40 dias após a plena floração e é influenciada por fatores ambientais, fisiológicos, como a ação de hormônios e a disponibilidade de carboidratos e, em alguns casos, por situações de estresse abiótico, que podem redirecionar os recursos da planta para o crescimento vegetativo em detrimento do reprodutivo. Durante as fases iniciais da diferenciação floral, o estresse térmico pode provocar malformações nas flores, resultando em estruturas com pedúnculos curtos e maior propensão ao abortamento no período da floração. A formação e a qualidade das flores são determinadas por uma interação complexa entre condições ambientais e práticas de manejo ao longo do ciclo da cultura. Na floração, diversos fatores, incluindo aspectos genéticos, climáticos e manejo do pomar podem contribuir para o abortamento floral, comprometendo a frutificação efetiva (Monteiro et al., 2015; De Oliveira et al., 2017; Tominaga et al., 2022).
Fatores genéticos — Algumas cultivares de macieira apresentam maior predisposição genética ao abortamento floral. É o caso das cultivares ‘Gala’ e ‘Monalisa’, que tendem a abortar mais flores do que ‘Fuji’ ou ‘Eva’. Em pomares com cultivares de baixa frutificação efetiva, recomenda-se adotar estratégias como a implantação de pelo menos 15% de plantas polinizadoras no pomar, além de aumentar o número de colmeias de abelhas para garantir uma polinização eficiente.
Entre os fatores ambientais o estresse térmico durante a floração, gerado por temperaturas extremas acima de 30 °C ou abaixo de 0 °C, tende a reduzir significativamente a frutificação efetiva. Altas temperaturas podem provocar queda natural dos frutos e prejudicar o desenvolvimento das estruturas florais. Já temperaturas baixas dificultam tanto a fixação adequada dos frutos quanto comprometem a atividade dos insetos polinizadores, especialmente as abelhas
Além disso, o estresse hídrico causado por excesso de chuvas pode comprometer a eficácia da polinização ao reduzir a atividade das abelhas. Chuvas intensas durante o período de floração dificultam o voo e a coleta de pólen pelas abelhas, resultando em menor frutificação. De forma geral, fatores estressantes no ciclo anterior, como excesso de chuva, variações drásticas na umidade ou mesmo temperaturas adversas, podem prejudicar o desenvolvimento das gemas floríferas, impactando negativamente a frutificação no ciclo atual.
Mas o manejo da planta ao longo do ciclo anterior tem grande influência no abortamento floral.
– Deficiência de nutrientes – a deficiência de nutrientes essenciais como nitrogênio (N), fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca), boro (B) e zinco (Zn) são particularmente críticas quando a brotação e a floração ocorrem simultaneamente. Nessa condição, estabelece-se uma competição entre o crescimento vegetativo e o desenvolvimento reprodutivo, com tendência à priorização do crescimento vegetativo e, consequentemente, maior taxa de aborto floral. Para mitigar esse problema, é fundamental realizar o monitoramento nutricional do pomar e aplicar correções, inclusive via foliar, especialmente de boro, micronutriente chave para o crescimento do tubo polínico e a fecundação do óvulo.
– Brotação ou floração muito intensa – Na cultura da macieira, o ciclo ideal prevê que a brotação ocorra de 5 a 10 dias após a floração. No entanto, quando não se atende à exigência de frio da cultivar, é comum que a brotação antecipe ou ocorra simultaneamente à floração (Figura 1). Essa sobreposição gera competição entre os tecidos vegetativos e floríferos, o que pode causar queda de flores ou frutos no início da frutificação, principalmente se a planta estiver com reservas de carboidratos insuficientes.
Nestas condições, aplicações foliares de bioestimulantes nutricionais podem auxiliar ao fornecer nutrientes diretamente aos tecidos em competição, reduzindo a queda inicial de flores ou frutos. Além disso, o uso de redutores do crescimento vegetativo pode favorecer a priorização do desenvolvimento floral. Atualmente, é possível também ajustar o momento da floração, antecipando-a ou retardando-a, para melhorar o sincronismo com cultivares polinizadoras.
– Pragas e Doenças – A ocorrência de pragas ou doenças durante o ciclo vegetativo pode afetar a fotossíntese das folhas, reduzindo drasticamente as reservas de carboidratos necessárias para o início do ciclo reprodutivo.
– Desequilíbrio hormonais – as flutuações nos hormônios vegetais podem interromper o desenvolvimento das flores e causar o abortamento.
– Falta de polinização – A polinização é o processo de transferência do grão de pólen da antera até o estigma de uma flor, essencial para iniciar o processo de fecundação e, garantir a reprodução da planta e produção de semente. Este processo pode ser facilitado por vários agentes, mas no caso da macieira é a abelha.
Entretanto, diversos fatores podem comprometer a eficiência desse processo, especialmente as condições ambientais adversas, como baixas temperaturas e períodos prolongados de nebulosidade. Nessas situações, a atividade das abelhas, principais agentes polinizadores da macieira, tende a diminuir, prejudicando a transferência do pólen entre as flores. Para compensar essa redução, recomenda-se aumentar o número de colmeias no pomar e, quando necessário, utilizar reguladores de crescimento que favoreçam o pegamento de frutos, especialmente em casos de descompasso entre as floradas das cultivares.
Além disso, em pomares com cobertura de tela, é fundamental monitorar a atividade das abelhas, certificando-se de que estão realizando a polinização de forma eficiente, principalmente nos dias com condições climáticas favoráveis. A polinização é um dos processos mais críticos na cultura da macieira, influenciando diretamente todas as etapas da produção, desde a frutificação inicial até a qualidade e a produtividade final dos frutos.
Outro fator fundamental para o sucesso reprodutivo da macieira é a qualidade das gemas floríferas, a qual deve ser cultivada e manejada adequadamente durante o ciclo vegetativo anterior. Portanto, uma gema florífera de boa qualidade produz uma flor de melhor qualidade (Figura 2), que é menos susceptível ao abortamento floral mesmo em condições desfavoráveis a polinização.


Referências:
DE OLIVEIRA, Cíntia Martins et al. Flowering, fruiting and physiology of apple tree under different irrigation levels in the Brazilian semiarid region. Comunicata Scientiae, v. 8, n. 1, p. 99-108, 2017.
MONTEIRO, Victor Magalhães et al. Floral biology and implications for apple pollination in semiarid Northeastern Brazil. J Agric Environ Sci, v. 4, n. 1, p. 42-50, 2015.
TOMINAGA, Akiyoshi et al. How is global warming affecting fruit tree blooming?“Flowering (dormancy) disorder” in Japanese pear (Pyrus pyrifolia) as a case study. Frontiers in Plant Science, v. 12, p. 787638, 2022.
José Luiz Petri1, Everlan Fagundes2
1Professor UNIARP/Curso de Agronomia/Fruticultura.
2Pesquisador Scienfruti Pesquisas LTDA – Fraiburgo – SC.
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