MANEJO DE PERDAS DE MAÇÃS EM PÓS-COLHEITA
No Brasil, as perdas das maçãs pelas podridões são importantes porque acumulam as causadas pelos patógenos de pós-colheita (Botrytis, Penicillium, Alternaria, Mucor, Rhizopus e Athelia) e pelas infecções latentes – causadas pelos patógenos de verão e pelos associados à podridão calicinar (Colletotrichum, Botryosphaeria, Neofabraea e Neonectria).
A podridão carpelar que ocorre nos clones de ‘Fuji’ é mais grave, mas em alguns anos ocorre também em outras variedades em maior intensidade. Essa doença é de etiologia complexa, ou seja, pode ser causada por vários dos patógenos já citados nas podridões, mas espécies de Alternaria são constatados com maior frequência.
No caso das doenças típicas de pós-colheita, a presença do inóculo dos patógenos é frequente tanto na epiderme, no pedúnculo e restos florais das maçãs, mas também nas embalagens e Packings. Enquanto isso, as fontes de inóculo das doenças de verão estão nos pomares.
A redução do inóculo inicial no campo é indispensável para redução dos danos, sendo que para conseguir isso é necessário a trituração e incorporação das folhas, a retirada e queima dos frutos, dos ramos da poda e dos cancros. O uso de cúpricos e de calda sulfocálcica em doses baixas de forma consecutiva antes do tratamento de superação da dormência é recomendado, além da pulverização do cobre na gema inchada, auxiliando na diminuição dos agentes patogênicos.
A importância do controle das doenças de verão reside no fato de que se não forem conduzidas de forma minuciosa, todas as demais práticas de manejo integrado das doenças serão mais limitadas. Em casos extremos, a produtividade pode ser comprometida em até 45% na região de Vacaria, RS.
As ferramentas de controle das doenças de verão são preventivas e possuem eficiência muito limitada nos pomares que apresentam alta incidência. Em pós-colheita, os desinfetantes e fungicidas usados são produtos de contato e não afetam as podridões latentes que já colonizaram os frutos. Portanto, o uso de desinfetantes deve ser preferido quando não se deseja efeito residual.
Incidência de podridões causadas pelas doenças de verão em pomares de Vacaria-RS
As graves perdas ocorridas nos últimos ciclos (Tabela 1) associadas ao uso de fungicidas com efeito preventivo e eficiência limitada ameaçam a sustentabilidade da cultura. É importante lembrar que os fungicidas – utilizados nos pomares – com efeito sistêmico nas folhas (IBE; SDHI e QoI-estrobilurinas) não são sistêmicos nas maçãs e, por isso, não se deve esperar efeito curativo. É sabido que o retorno do uso dos fungicidas só ocorre quando o inóculo é baixo e o manejo da cultura é adequado para desfavorecer a ocorrência de epidemias.
Tabela 1. Frutos (%) com podridão na colheita comercial na área sem proteção química do pomar em Vacaria-RS.
Ciclo | Frutos com podridão (%) | |||
P. amarga | P. calicinar | Pinta de Glomerella | Todas as maçãs com sintomas¹ | |
2023/24 | 13,9 | 4,7 | 38,9 | 89,7 |
2024/25 | 23,2 | 8,0 | 22,6 | 56,5 |
¹Podridões amarga, branca, olho de boi, Nectria, calicinar, pinta de Glomerella e sarna.
Características das variedades e suscetibilidade à rachaduras na epiderme
As lesões ou feridas abertas naturais ou provocadas favorecem a infecções pelos patógenos. Algumas cultivares têm suscetibilidade genética para desenvolver rachaduras por terem casca e cutícula fina. Nelas se incluem Gala, Fuji, Golden Delicious e Pink Lady. Além disso, também apresentam rachaduras calicinares e /ou pedunculares (Figura 1). No caso da Gala, essas rachaduras ocorrem pelo fato das maçãs terem taxa diferente de crescimento celular da epiderme e da polpa. Essas características são agravadas quando ocorrem temperaturas amenas e baixa umidade relativa com alternância de períodos quentes e de baixa temperatura.
Figura 1. Rachadura calicinar (esquerda) e podridão calicinar por Neonectria (direita) (Proterra, 2025).
Características dos novos fungicidas disponíveis na pós-colheita da maçã
O Fludioxonil é um fungicida de contato não sistêmico, do grupo de fenilpirrol, é eficiente para controle de Neonectria, Colletotrichum, Penicillium, Rhizopus, Botytis, Alternaria e outros patógenos. Seu modo de ação se caracteriza pela alteração das funções das células dos fungos, afetando, em especial, a resposta ao estresse osmótico celular. Ele bloqueia a proteína kinase relacionada ao transporte do glicerol, o que acarreta na acumulação intracelular do glicerol e inibição da formação de hifas. Em Colletotrichum inibe o tubo germinativo, a formação de apressórios e o crescimento micelial, enquanto que em Penicillium expansum diminui a germinação de conídios e o crescimento micelial. O Fludioxonil seleciona estirpes resistentes quando utilizado frequentemente e, por isso, é necessário monitorar permanentemente a resistência do patógeno a ele.
O Pirimetanil pertence ao grupo das anilinopirimidinas e tem efeito preventivo. Controla uma ampla gama de patógenos como Botrytis, Penicillium, Neofabraea e Colletotrichum. Atua principalmente como preventivo, inibindo o crescimento dos patógenos. Não afeta a germinação dos esporos, mas diminui o desenvolvimento do tubo germinativo. Seu principal modo de ação é a limitação, afetando a biossíntese da metionina que é um aminoácido necessário para os microrganismos crescerem e se multiplicarem.
O uso de Pirimetanil em pós-colheita também possui o risco de selecionar estirpes resistentes dos organismos alvo. Um caso especial é o de Botrytis cinerea, pois a pressão de seleção já é feita pelo uso desse produto no campo. Estudos realizados em Vacaria-RS mostraram a presença de estirpes resistentes de Botrytis cinerea e de Penicillium expansum ao pirimetanil, enquanto que pesquisas conduzidas fora do Brasil mostram resistência de Penicillium e de Botrytis ao pirimetanil e ao fludioxonil.
Considerações gerais
– O diagnóstico adequado do tipo dominante de doenças deverá decidir a necessidade de uso, a forma e local de tratamentos que devem ser realizados;
– É necessário separar as estratégias válidas para controle de Penicillium – o único capaz de crescer, infectar e se multiplicar em pós-colheita – das que serão necessárias para infecções latentes, as quais iniciam no pomar;
– Os fungicidas têm vantagem de efeito residual longo quando comparados com os desinfetantes, entretanto os fungicidas terão risco de deixar resíduos não permitidos na fruta e selecionar estirpes resistentes;
– As empresas que comercializam os fungicidas para uso em pós-colheita devem conduzir programas de monitoramento da resistência dos patógenos.
Rosa Maria Valdebenito Sanhueza
Vinicius Bartnicki
Centro de Pesquisa Proterra
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